quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

O jornalismo cidadão diante de novos rumos

Carlos Castilho 

O turbilhão de mudanças que afeta o jornalismo desde o advento da internet e da web está provocando a aposentadoria de mais um opção entre as dezenas surgidas desde que os profissionais perderam o monopólio da publicação de notícias.
A bola da vez é o conceito de jornalismo cidadão, que durante um par de anos foi visto como uma alternativa ao chamado jornalismo convencional. A lenta perda de conteúdo para a ideia de um jornalismo feito por pessoas comuns não representa um retorno à ortodoxia corporativa e nem o fim de um sonho.
Trata-se basicamente da evolução de um processo de exploração da nova realidade informativa criada pela internet e pela Web. Quando os leitores, ouvintes e telespectadores descobriram que também podiam ser protagonistas ativos no processo de produção e disseminação de notícias houve de imediato uma justificada euforia.
Afinal estava caindo um monopólio informativo da imprensa convencional e surgiam as primeiras experiências de produção alternativa, logo batizadas de jornalismo cidadão, porque eram praticadas por pessoas comuns, jornalistas autônomos e organizações da sociedade civil. Houve uma explosão de criatividade fora das redações, ao mesmo tempo em que a crise do modelo de negócios da imprensa chegava a limites inimagináveis.
Hoje começam a surgir os primeiros sinais de uma nova mudança que será muito menos barulhenta, mas nem por isto menos radical. A questão não é mais propor novos softwares e nem novas alternativas. O grande dilema passou a ser como sobreviver, como ser sustentável num ambiente informativo que ainda está passando por grandes mudanças.
Se antes a grande preocupação da imprensa era dispor de megafones cada vez mais potentes para poder ampliar o seu poder de disseminação de notícias, agora o principal desafio deixou de ser tão ruidoso para concentrar-se na capacidade de dialogar com o seu público. Um desafio que vale tanto para as combalidos conglomerados da indústria da comunicação com para os novos aventureiros do jornalismo autônomo.
A preocupação com a sustentabilidade está criando duas tendências entre os principais projetos de jornalismo cidadão. Os que obtiveram êxito comercial e ampliaram suas audiências estão sendo cobiçados pelos conglomerados como aconteceu com o site norte-americano The Huffington Post, absorvido pelo grupo AOL (American Online) por 350 milhões de dólares.
Os projetos que sobrevivem à custa do trabalho de profissionais e amadores que tem outras fontes de renda, vivem agora o dilema de crescer ou morrer de inanição. O gás inicial está sendo suplantado por um justificável cansaço diante da necessidade de pensar em dinheiro, mais do que em inovações.
Ninguém expressou melhor este dilema e suas consequências do que as suecas Gitta Wilén e Lotta Holmström, duas experientes jornalistas responsáveis pela criação do projeto Citizen Media Watch, que durante quase cinco anos foi uma das principais referências do jornalismo cidadão. Em meados de janeiro de 2011, elas decidiram suspender a atualização do site, que continua disponível como arquivo para quem desejar estudar a gênese da experiência.
Gitta e Lotta resolveram mudar de ares ao verificar que o problema não era mais levantar poeira, mas fazer com que ela assentasse em novas bases. Isto significa essencialmente buscar a sustentabilidade e a autossuficiência, dois objetivos que parecem fáceis de explicar, mas dificílimos de concretizar, especialmente na conjuntura atual.
Mas sem eles não há experiência capaz de durar muito tempo. A ideia de que os projetos precisam ser quase eternos está sepultada pela própria realidade. O ciclo de vida de um empreendimento é hoje bem curto porque a inovação obriga às transformações constantes. Mas o problema é que a taxa de mortalidade das experiências de jornalismo cidadão foi extraordinariamente alta, indicando o surgimento de um novo problema, numa área onde a expertise é ainda menor do que na exploração da Web como plataforma de veiculação de notícias e informações.
A nova terra prometida do jornalismo na Web é a procura de modelos de autossustentabilidade. O que se conhece nesta área é quase nada, a não ser frustrações em sequência. A grande diferença é que será uma busca bem mais silenciosa do que o estardalhaço e os modismos das inúmeras variantes do jornalismo cidadão. Também será uma iniciativa que dependerá mais da interatividade do que de gênios isolados. Mais da conversa do que do trombone.
Este post também é uma autocrítica pessoal. Também fui seduzido pelas incríveis possibilidades do jornalismo cidadão, a ponto de tê-lo transformado em pesquisa de pós-graduação. Começo a ver que suas potencialidades dependem agora de sua viabilidade prática, ou seja, um modelo de sustentabilidade financeira. O processo de inovação no jornalismo cidadão está sendo obrigado a assumir novos rumos.

Esse artigo foi originalmente publicado no blog Código Aberto.

Carlos Castilho é jornalista com 35 anos de experiência em rádio, jornais, revistas, televisão e agências de notícias no Brasil e no exterior. Pode ser encontrado no blog Código Aberto. Twitter: @ccastilho

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